O Bairro

A origem do Centro Histórico


Oficialmente contando com uma população de quase 37 mil moradores, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Bairro Centro foi criado e delimitado pela Lei 2.022, de 1959, mas sua origem remonta os primórdios da ocupação de Porto Alegre. Com seu povoamento e desenvolvimento, em função da criação da freguesia Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre em 1772, possui íntima ligação com a Rua dos Andradas que, ainda hoje, é chamada de Rua da Praia, sua primeira denominação. E foi nela, a mais antiga da cidade, que se estabeleceu a primeira capela da Vila com invocação de São Francisco. A abertura das atuais ruas Riachuelo e Duque de Caxias, formavam, junto com a Rua da Praia, as principais vias da Vila, onde se assentaram as mais antigas residências e casas comerciais. Os arrabaldes mais próximos, como a atual Cidade Baixa, eram considerados zonas rurais.

A peculiar denominação de logradouros antigos do Centro é o fato de fazerem referência a alguma característica que possuía, como a Rua do Arvoredo (atual Fernando Machado), a Rua do Riacho (atual Washington Luis), a Rua da Varzinha (atual Demétrio Ribeiro), o Beco do Fanha, depois denominada Travessa Paysandu (atual Caldas Júnior), a Rua do Poço (atual Jerônimo Coelho), entre outras.

A antiga e tradicional Rua Duque de Caxias teve mais de uma denominação, conforme diferentes registros: Rua Formosa, Rua Direita da Igreja, Rua Alegre e Rua da Igreja. Mas o primeiro nome oficial foi o de Rua da Igreja, por ali localizar-se o único santuário da cidade. Foi, por anos, a rua mais nobre da cidade, residindo ali políticos, comerciantes e militares de altas patentes em luxuosos sobrados e solares das famílias aristocráticas da cidade, como o Solar dos Câmaras, mais antigo prédio residencial de Porto Alegre. Nos "Altos da Praia"  foi construída a Igreja da Matriz, atual Catedral Metropolitana e a Praça Marechal Deodoro, mas conhecida como Praça da Matriz. Abriga, ainda, os prédios dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, e o Teatro São Pedro, o mais antigo da cidade, concluído em 1858.

A Rua Riachuelo também teve outras denominações, como Rua do Cotovelo, nas proximidades do Teatro São Pedro, e Rua da Ponte. Suas primeiras residências remontam ao ano de 1788. Típica rua de zona central, nela residiam pessoas ligadas à classe dirigente.


As igrejas do Centro são também locais que nos remontam a histórias e costumes de seus habitantes. A Catedral Metropolitana teve sua primeira edificação em 1794, porém só foi finalizada no século XIX, com a construção de suas duas torres em 1846. No ano de 1915, o arcebispo Dom João Becker inicia estudos preliminares para a construção da grande Catedral, cujas primeiras obras iniciam em 1920, e a finalização da nova Igreja da Matriz, no seu estilo Romano Renascentista, ocorreu em 1972, com a conclusão da cúpula. Mas, somente em 1986, ela é inaugurada e dada por concluída. A Igreja Nossa Senhora dos Dores, na Rua dos Andradas, é a mais antiga da cidade, e sua construção pela irmandade Ordem Terceira Nossa Senhora das Dores, remonta a 1807, somente sendo concluída em 1904.

A primeira edificação da Igreja Nossa Senhora do Rosário, localizada na Rua Vigário José Inácio, em estilo barroco, foi realizada entre os anos de 1817 e 1827, pela Irmandade Nossa Senhora do Rosário, confraria de negros livres e escravos, cumprindo importante papel, durante todo o século XIX, na vida de pessoas dessa comunidade. Sob alegação de não comportar seus fiéis, em 1950 a Mitra Arquidiocesana mandou demolir o prédio, erigindo a atual sede da Igreja.


No chamado paralelo 30, na Praça Montevidéo, está implantado o Paço Municipal, sede da Prefeitura de Porto Alegre, iniciada em 1898. Em frente ao prédio está a Fonte Talavera, doada pela comunidade espanhola através da “Sociedade Espanhola de Socorros Mútuos”, em homenagem ao centenário da Revolução Farroupilha. Do outro lado da Avenida Borges de Medeiros está o Mercado Público Central, edificado pela primeira vez em 1844, como espaço de comercialização e sociabilização da população.

No ano de 1870 foi inaugurado o novo prédio. O Mercado Público sempre teve importante papel para cidade: além de seu comércio, durante o século XIX era o local onde circulavam as últimas notícias do Brasil, devido ao intenso fluxo de pessoas, sobretudo em função do Porto. Seus bares também eram referências para encontros, principalmente pela boemia da cidade. No térreo do Mercado encontra-se o mais antigo bar da cidade, O Naval, onde se pode encontrar uma boa parte da memória da cidade. O atual prédio do Mercado, no Largo Glênio Peres, possui a mesma aparência externa, mesmo após o incêndio de 1912 e da construção do segundo piso, no ano de 1913, na administração republicana do Intendente José Montaury. Sua restauração foi inaugurada em 1997.

A Avenida Borges de Medeiros, outro logradouro importante que atravessa a área central, teve sua obra iniciada na segunda década do século XX, na administração do intendente Otávio Rocha. O projeto incluía a construção do Viaduto Otávio Rocha, primeiro viaduto da cidade. As obras foram concluídas na década de 1940, na administração de José Loureiro da Silva. Nesta administração o centro da cidade começou a adquir, cada vez mais, características das modernas cidades do século XX, com suas amplas avenidas e arranha-céus.


O Centro dispõe dos mais diversos e variados serviços e entretenimento, sobretudo ligados às atividades histórico-culturais. Na Rua Duque de Caxias está localizado o Museu Júlio de Castilhos - instituição cultural criada por decreto estadual, em 1903 - com caráter de museu antropológico, artístico e histórico. O prédio, em estilo neoclássico, foi residência do presidente do Estado do Rio Grande do Sul, Julio de Castilhos até o ano de 1905, quando foi adquirido pelo Governo Estadual para abrigar o Museu.

Na Rua dos Andradas, encontramos, entre outros:
  • O Museu da Brigada Militar, o Museu do Trabalho, os quartéis e o Museu do Exército, próximo ao Gasômetro;
  • O imponente prédio do Hotel Majestic, atual Casa de Cultura Mario Quintana, transformado em centro cultural no final da década de 80;
  • A sede do Museu José Hipólito da Costa, na esquina com a Rua Caldas Júnior, no prédio onde funcionava a sede do Jornal A Federação;
  • A sede do Grupo Caldas Júnior (Correio do Povo), em frente ao Museu Hipólito, ocupando a quadra que vai até a rua Sete de Setembro.
  • O Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli, Santander Cultural e o Memorial do Rio Grande do Sul, na Praça da Alfândega;
  • A Usina do Gasômetro,  na extremidade oeste, no local antigamente chamado Praia do Riacho.
Antecedentes históricos


A origem do Centro urbano de Porto Alegre confunde-se com a própria origem da cidade. Isto porque foi exatamente neste sítio, habitando por indígenas de diversas raças como Charruas, Tapes e Guaicanãs, até 1700, que se originou o processo de colononização. Com o avanço paulista em direção ao Sul, a fundação de Lages em 1684, Viamão em 1730 e da Colônia do Sacramento, abre-se o caminho ao comércio e ao surgimento das cidades. Os bandeirantes dividem entre si as terras da região, cabendo a Jerônimo de Ornelas uma sesmaria às margens do Guaíba, cuja área aproximava-se a do atual Município de Porto Alegre. A posse desta área foi reconhecida em carta oficial em 1740, data considerada como a de origem da nova cidade.

As primeiras manifestações urbanas ocorreram na Praia do Arsenal, conhecida como Ponta da Cadeia, com a construção dos primeiros prédios públicos: Casa da Câmara do Governador, Cadeia e Forca, esta última fronteira ao desembarcadouro.

A partir deste ponto são estabelecidas ligações através de caminhos, com a localidade de Viamão e os aldeamentos índios, primeiro esboço da futura estrutura viária urbana. Considerando os condicionantes históricos, políticos e econômicos da época, como as lutas entre Portugal e a Espanha pela conquista de territórios, compreende-se o rápido desenvolvimento ocorrido, em detrimento de outros núcleos contemporâneos.  Efetivamente, a posição geográfica de Porto Alegre foi decisiva na questão militar e adequada ao comércio nos momentos de paz. O próprio governo português, reconhecendo esta posição previligiada, enviou famílias de Açorianos para a nova localidade.

No período colonial, o desenvolvimento do núcleo era caracterizado pelo crescimento ao longo do rio, a partir da Ponta da Cadeia na direção leste e paralelo ao cais. A encosta norte do promontório favorecia as embarcações e ali eram realizados os contatos com o exterior. Naturalmente situaram-se nesta zona as principais atividades comerciais e residenciais, sendo que a encosta sul não possuia valor. Ainda neste período foi criado o segundo centro cívico na parte mais elevada da colina, no entorno da Praça da Matriz, com a edificação da Catedral e o Palácio do Governo.

No ano de 1773 as muralhas, paliçadas de madeira, foram construídas ao longo da Rua da Conceição, Praça do Portão, Sarmento Leite, Praia de Belas, servindo, durante 100 anos, de anteparo ao desenvolvimento em direção ao continente. No aspecto urbano, o período colonial  é caracterizado, fundamentalmente, pelo preenchimento dos vazios no interior das muralhas. Fora delas há o plantio, fundamentalmente de trigo, um pequeno comércio e o artesanato. A situação de crescimento intra-muros acentuou-se, ainda mais, no período Imperial, com o advento da Revolução Farroupilha (1835/45). Há uma atrofia no crescimento urbano e um adensamento desproporcional na área Central, originando as bases polarizadoras do futuro.


Mesmo com a chegada dos imigrantes com tradição manufatureira e o rompimento das muralhas, em termos de crescimento territorial urbano, a valorização da área central permanece. Efetivamente quase a totalidade dos edifícios públicos e comerciais foram construídos nesta área, atraindo a população que ocupava, gradativamente, as cristas e os vales, porque ali ocorriam as suas atividades principais.

Os primitivos caminhos foram trasnformados em avenidas que, por sua vez, geraram as vias secundárias. Todo esquema assim disposto converge para o centro urbano que, fisicamente, não tem possibilidade de se expandir, a não ser verticalmente. Aquela qualidade primitiva do promontório que dominava as planícies ao sul e o estuário do Guaíba, desaparecida a questão militar, e abertos novos caminhos para o Interland, tornou-se um fator de anomalia para o desenvolvimento da área central. Agora, o pólo principal está geograficamente excêntrico à cidade, asfixiando suas atividades pelo adensamento violento de uma pequena área que preservou a mesma estrutura do período colonial com uma população várias vezes maior.

Referências:
Proposições para a Área Central de Porto Alegre. Prefeitura Municipal de Porto Alegre. 1971
"Expediente Urbano de Porto Alegre", engenheiro e urbanista Edvaldo Pereira Paiva. 1942
Centro de Pesquisa Histórica - Coordenação de Memória Cultural da Secretaria Municipal de Cultura
FRANCO, Sérgio da Costa. Porto Alegre: Guia Histórico. 2º edição. Porto Alegre: Ed Universidade/UFRGS, 1992.